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07/10/24

Caxias

Paulo Marinho é condenado a prisão e multa pelo artigo 171, processo transitado em julgado, não cabe mais recurso

YGOR MOTTA | CAXIAS-MA

03/06/2023 10h47

SENTENÇA TIPO "D"

PROCESSO: 0006026-45.2016.4.01.3700

CLASSE: AÇÃO PENAL - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO (283)

POLO ATIVO: Ministério Público Federal (Procuradoria)

POLO PASSIVO:PAULO CELSO FONSECA MARINHO

REPRESENTANTES POLO PASSIVO: ROSANGELA DE FATIMA ARAUJO GOULART - MA2728, ROSARIO FONSECA MARINHO - MA11303 e PAULO CELSO FONSECA MARINHO - MA2518

 

SENTENÇA

1. RELATÓRIO

1.1. PARTES

DENUNCIANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

DENUNCIADO: PAULO CELSO FONSECA MARINHO, pelo crime previsto nos artigos 171, §3º do Código Penal.

1.2. FUNDAMENTO FÁTICO

Narra a denúncia que PAULO CELSO FONSECA MARINHO, enquanto titular da empresa FAZENDA ESTRELA (CNPJ 00.291.128/0001-51), após participar de procedimento licitatório, firmou o contrato n° 141/2009/SES, com a Secretaria de Estado da Saúde/MA, para fins de execução de parcela do Convênio n° 09/2009-SESAN, firmado com a União, por intermédio do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome, para desenvolvimento das ações do Programa de Incentivo à Produção e ao Consumo de Leite (Programa Leite é Vida), no valor de R$1.718.750,00 (um milhão, setecentos e dezoito mil, setecentos e cinquenta reais).

Ocorre que, para lograr êxito na adjudicação do objeto da licitação, o denunciado juntou ao procedimento documento de empresa diversa, porém com nome similar, também de sua propriedade, ESTRELA AGROPECUÁRIA E INDÚSTRIA LTDA - ME (CNPJ 23.668.205/0001-45), eis que a primeira empresa (FAZENDA ESTRELA) encontrava-se perante a JUCEMA em situação cancelada (com requerimento de reativação dias após firmado o Convênio em comento), não possuindo ainda registro de inspeção federal tal como exigido expressamente em cláusula do ajuste.

Assim, aduz o órgão ministerial que o denunciado, ciente de que a empresa que pretendia habilitar no certame estava recém reativada, sem registro no SIF - Serviço de Inspeção Federal, fez juntar ao procedimento documento de empresa diversa, circunstância que caracterizou ardil capaz de induzir a erro a Comissão de Licitação, satisfazendo requisito necessário, sem o qual seria impossível obter a vantagem.

1.3. BASE DA DENÚNCIA

A peça acusatória veio instruída com os autos do Inquérito Civil Público nº 1.19.000.000428/201.2-77.

1.4. PROCEDIMENTO

A denúncia foi recebida em 24 de fevereiro de 2016 (Id 643828514, pág. 201/202).

Citado, PAULO CELSO FONSECA MARINHO apresentou resposta à acusação por intermédio de advogado constituído (Id 643828514, pág. 212/216). Juntou documentos.

Mantido integralmente o recebimento da denúncia (Id 643828518, pág. 13/15).

Em sede de instrução, procedeu-se à inquirição das testemunhas arroladas pela acusação (Elenita Almeida de Sousa, José Carlos de Paiva Santos e Maria José Cardoso Rodrigues Batista) e pela defesa (Elisa Torres da Silva e Antônio Rodrigues Bezerra), sendo, ao final, interrogado o réu, conforme registros audiovisuais que instruem os autos.

Não houve pedido de diligências.

O Ministério Público Federal apresentou suas alegações finais, requerendo a condenação do réu nas penas do art. 171, §3º do Código Penal (Id 643828518, pág. 138/142).

A defesa do réu, por sua vez, apresentou alegações finais pugnando pela sua absolvição, diante da ausência de provas de conduta criminosa e de dolo (Id 643828518, pág. 158/165).

O julgamento foi convertido em diligência, determinando-se a intimação do Ministério Público Federal para manifestação a respeito da possibilidade de oferecimento de acordo de não persecução penal ao acusado.

Oferecida pelo MPF proposta de ANPP (Id 643828518, pág. 173/174), o réu, embora intimado pessoalmente, não se manifestou nos autos, entendendo-se pela rejeição tácita do acordo (Id 1033006283).

2. FUNDAMENTAÇÃO

Conforme relatado, a denúncia imputa a PAULO CELSO FONSECA MARINHO, proprietário da empresa individual PAULO CELSO FONSECA MARINHO - FAZENDA ESTRELA (CNPJ n° 00.291.128/0001-51), a conduta de haver participado de procedimento licitatório, firmando o contrato n° 141/2009 com a Secretaria de Estado da Saúde do Maranhão, mediante indução da comissão de licitação a erro, com o fim de obter vantagem indevida, incorrendo no ilícito tipificado no art. 171, §3º, do Código Penal.

Segundo a acusação, o contrato firmado pelo réu tinha como objeto a execução de parcela do Convênio n° 09/2009-SESAN, assinado com a União por intermédio do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome, para desenvolvimento de ações do Programa de Incentivo à Produção e ao Consumo de Leite (Programa Leite é Vida), no valor de R$ 1.718.750,00 (um milhão setecentos e dezoito mil setecentos e cinquenta reais). Ocorre que o acusado, representante da PAULO CELSO FONSECA MARINHO - FAZENDA ESTRELA (CNPJ n° 00.291.128/0001-51) juntou ao procedimento licitatório documento relativo a empresa diversa, com nome similar, também de sua propriedade, denominada ESTRELA AGROPECUÁRIA E INDÚSTRIA LTDA - ME (CNPJ n°23.668.205/0001-45), uma vez que a primeira empresa encontrava-se recém reativada perante a JUCEMA e não possuía registro de inspeção federal, tal como exigido expressamente em cláusula do ajuste.

Assim, aduz o órgão ministerial que PAULO CELSO FONSECA MARINHO, ciente de que a empresa que pretendia habilitar no certame estava sem registro no Serviço de Inspeção Federal, fez juntar ao procedimento documento de empresa diversa, circunstância que caracterizou ardil capaz de induzir a erro a comissão de licitação, satisfazendo requisito necessário, sem o qual seria impossível obter a vantagem.

Materialidade e autoria encontram suporte nos seguintes documentos que instruem os autos:

i) a cópia do Convênio n° 09/2009 firmado pela União, por intermédio Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome, com o Estado do Maranhão, este por intermédio da Secretaria de Estado da Saúde (SES), em 03/05/2009 (Id 643828510, pág. 54/67), bem como os editais de credenciamento, portaria de requisitos para a formalização do contrato, etc;

ii) documentos encaminhados e assinados por PAULO CELSO FONSECA MARINHO para habilitar a “Fazenda Estrela” (CNPJ n° 00.291.128/0001-51) no procedimento licitatório (Id 643828511, pág. 8/27);

iii) contrato n° 141/2009/SES, firmado entre o Estado do Maranhão, através da Secretaria de Estado da Saúde e PAULO CELSO FONSECA MARINHO, através da Fazenda Estrela (CNPJ n° 00.291.128/0001-51), datado de 28/10/2009 (Id 643828511, pág. 188/192);

iv) título de registro n° 1957 (SIF n° 1957) juntado na relação de documentos encaminhados ao certame pelo acusado, pertencente à empresa diversa, qual seja, ESTRELA AGROPECUÁRIA E INDUSTRIAL LTDA. (Id 643828511, pág. 21);

v) certidão da JUCEMA na qual vê-se que a empresa PAULO CELSO FONSECA MARINHO - FAZENDA ESTRELA constava como cancelada em 2007, bem como requerimento de reativação da referida empresa, no ano de 2009 (Id 643828511, pág. 9/10);

vi) relatórios de pesquisa feitos pelo MPF informando a ausência de registro no Sistema de Inspeção Federal — SIF em nome da empresa PAULO CELSO FONSECA MARINHO - FAZENDA ESTRELA, bem como que a empresa ESTRELA AGROPECUÁRIA E INDÚSTRIA LTDA-ME é detentora do SIF n. 1957 (Id 643828514, pág. 182/198).

Consta ainda nos autos que, oficiada a Secretaria de Estado da Saúde sobre a ausência de comprovação da qualificação técnica da empresa credenciada PAULO CELSO FONSECA MARINHO – FAZENDA ESTRELA, de CNPJ n° 00.291.128/0001-51, tendo em vista que o registro no Serviço de Inspeção Federal apresentado pela referida empresa consta em nome de ESTRELA AGROPECUÁRIA E INDUSTRIAL LTDA., de CNPJ n° 23.668.205/0001-57, foi informado que:

“(…) inicialmente, cabe esclarecer que o Regulamento da Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal, aprovado pelo Decreto n° 30.691, de 29 de março de 1952, determina que todo e qualquer estabelecimento que processa produtos de origem animal deve se submeter a uma inspeção prévia em estabelecimento registrado em Serviço de Inspeção Federal (SIF), quando esses produtos se destinam ao comércio interestadual ou internacional.

Ao indicar documentos para habilitar-se na licitação, a Fazenda Estrela apresentou o título de registro de empresa do mesmo grupo localizada no mesmo endereço, empresa esta responsável pela captação, pasteurização e distribuição do produto.

À época, a referida empresa apresentou SIF ativo n° 1957, concedido por meio do Processo n° 21022.000369/1995-51, desde 26/12/96.

Assim, verifica-se que apenas o procedimento de processamento do leite era realizado em um dos estabelecimentos do grupo da empresa credenciada.

Dessa forma, depreende-se que, embora a empresa PAULO CELSO FONSECA MARINHO - FAZENDA ESTRELA, CNPJ n° 00.291.128/0001-51, tenha apresentado um Título de Registro do Departamento de Inspeção de Produtos de Origem Animal da empresa ESTRELA AGROPECUÁRIA E INDUSTRIA LTDA., CNPJ n° 23.668.205/0001-57, o leite que chegou ao seu destinatário final foi processado pelo mesmo proprietário da empresa credenciada, tendo sua pasteurização deslocada para outra corporação pertencente ao conjunto de empresas de seu titular, alcançando-se de igual forma a finalidade do Programa. (…)” - Id 643828514, pág. 108/109.

Diante destes fatos, foi instaurada sindicância para apurar a responsabilidade por possíveis irregularidades na contratação de empresas para o fornecimento de leite oriundo do Convênio n. 009/2009. Quanto à ausência de comprovação da qualificação técnica da empresa credenciada “Fazenda Estrela” (CNPJ n° 00.291.128/0001-51), uma vez que o registro no Serviço de Inspeção Federal apresentado pertencia à outra empresa, o referido procedimento disciplinar concluiu, após a realização de diligências, que:

“(…) Houve a inclusão nos autos de documento referente à empresa Estrela Agropecuária e Indústria Ltda., muito embora esta não tenha sido cadastrada para o Programa do Leite, o que demonstram, por ora, somente fortes indícios da autoria do fato, sem contudo saber qual a verdadeira intenção com a inclusão da referida empresa sem que a mesma tivesse ao menos cadastrada como participante do Programa (...)” - Id 643828514, pag. 171/175.

Os depoimentos testemunhais colhidos em Juízo não forneceram maiores informações sobre o fato objeto dos autos.

José Carlos de Paiva Santos declarou que, na época dos fatos, era conselheiro do CONSEA, conselho que acompanha a execução e fiscalização de programas relacionados à segurança alimentar no Estado; recorda que houve uma denúncia feita pela conselheira Ermelinda quanto a uma irregularidade no credenciamento de um laticínio, sendo denunciado o fato ao Ministério Público, mas depois não acompanhou o desdobramento dos fatos (Id 643943484).

Maria José Cardoso Rodrigues Batista afirmou que era funcionária da Secretaria de Saúde e foi presidente da comissão de licitação, mas não recorda dos fatos objeto da denúncia; recorda apenas de ter participado do credenciamento para a aquisição de leite e da participação do réu, mas não recorda de maiores detalhes (Id 643943493).

Elisa Maria Torres da Silva era servidora do Estado do Maranhão, coordenadora do Programa do Leite em Caxias/MA; que sabia que a Fazenda Estrela, de Paulo Celso Marinho, era responsável pela entrega do leite para distribuição à população; acha que o leite vinha também de outros fornecedores e lá na Fazenda era pasteurizado (Id 643943483).

Interrogado em Juízo, PAULO CELSO FONSECA MARINHO afirmou que é proprietário da Fazenda Estrela e sócio da empresa Estrela Agropecuária; que só uma empresa participou do credenciamento; houve um chamamento do Estado para credenciar empresas para distribuir o leite; o Estado do Maranhão, na época, só tinha dois laticínios, o seu e o São José; foi feito um chamamento e um credenciamento; que a empresa apresentou todos os documentos exigidos; eles não eram o fornecedor do leite, este era apenas coletado, beneficiado e entregue à população; que atenderam tudo que estava no chamamento; não havia exigência de SIF, já que o leite não era entregue de maneira interestadual; que por isso entrou com sua empresa individual; o edital de chamamento não pedia SIF, não havia essa exigência, por isso não é verdadeira a acusação que lhe é feita (Id 643849496).

Ao revés do que alega o acusado, os documentos que instruem os autos, mencionados supra, apontam que o edital de credenciamento em análise previa a comprovação de qualidade técnica do licitante através de registro de serviços de inspeção federal, estadual ou municipal, dentre outros documentos (item 3.6, no Id 643828510, pág. 73).

Além disso, a subcláusula terceira do convênio previa que “As usinas de leite deverão possuir inspeção federal, estadual ou municipal, estar em dia com suas obrigações fiscais e trabalhistas e possuir cadastro atualizado dos fornecedores” (Id 643828510, pág. 55).

Tanto havia a exigência de registro do estabelecimento em serviço de inspeção que o acusado apresentou, para o credenciamento da Fazenda Estrela, o título de registro n° 1957 (SIF n° 1957) - pertencente à empresa diversa, qual seja, Estrela Agropecuária (Id 643828511, pág. 21).

Demais disso, comprovam a exigência em questão o ofício mencionado supra, oriundo da Secretaria de Estado da Saúde, manifestando-se sobre a ausência de comprovação da qualificação técnica da empresa credenciada “Fazenda Estrela”, bem como a instauração de sindicância para apurar a responsabilidade por possíveis irregularidades na contratação da empresa para o fornecimento de leite.

Vê-se que, de fato, o edital de credenciamento e termo de convênio exigiam a apresentação de registro do estabelecimento em serviço de inspeção (SIF) e, para o credenciamento da empresa Fazenda Estrela (CNPJ n° 00.291.128/0001-51) foi juntado ao procedimento documento de registro no Serviço de Inspeção Federal (SIF n° 1957), pertencente a outra empresa, ESTRELA AGROPECUÁRIA E INDÚSTRIA LTDA. (CNPJ n°23.668.205/0001-45).

Além disso, ficou constatado também que a empresa participante do credenciamento e posteriormente contratada (FAZENDA ESTRELA - CNPJ n° 00.291.128/0001-51) não possuía o referido registro, de forma que não preenchia requisito necessário e expressamente previsto para firmar o contrato (conforme relatórios de pesquisa informando a ausência de registro no Sistema de Inspeção Federal — SIF em nome da empresa PAULO CELSO FONSECA MARINHO - FAZENDA ESTRELA, no Id 643828514, pág. 182/198).

Assim, suficientemente comprovado nos autos que PAULO CELSO FONSECA MARINHO induziu a erro a comissão de licitação, porquanto, ciente de que a empresa que pretendia habilitar no certame estava sem registro no Sistema de Inspeção Federal, fez juntar ao procedimento licitatório documento de empresa diversa, com o fim de obter a adjudicação do objeto.

Tal o contexto, reputo comprovado, além da materialidade e autoria delitivas, o elemento subjetivo do tipo penal, consistente na vontade consciente de obter vantagem indevida em decorrência de fraude.

Por fim, embora o Ministério Público Federal tenha imputado ao réu o delito descrito no art. 171 do Código Penal (Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento), entendo que tal figura típica não encontra adequação no caso sob julgamento.

Isto porque o estelionato é crime patrimonial, que prevê a obtenção de vantagem ilícita, em prejuízo alheio e cujo dano causado, economicamente apreciável, deve ser efetivo.

No caso, pelo que consta nos autos, o objetivo do programa federal foi atingido, isto é, houve de fato a prestação do serviço pela empresa pertencente ao acusado, sendo que a vantagem patrimonial por ele recebida decorreu do serviço efetivamente prestado (fornecimento de leite, oriundo do Convênio n. 009/2009).

Assim, não houve a obtenção de vantagem patrimonial indevida por parte do acusado, uma vez que os recursos públicos por ele recebidos decorreram da execução do convênio.

Na realidade, a conduta praticada pelo réu, ora reconhecida, encontra subsunção no crime previsto no art. 90 da Lei de Licitações, vigente à época dos fatos, a saber:

Frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo do procedimento licitatório, com o intuito de obter, para si ou para outrem, vantagem decorrente da adjudicação do objeto da licitação:

Pena: detenção, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos e multa.

Isto é, a conduta praticada pelo réu foi a frustração, mediante expediente fraudulento, do caráter competitivo da licitação, obtendo vantagem indevida, que foi a adjudicação do objeto, firmando o contrato n° 141/2009 com a Secretaria de Estado da Saúde do Maranhão.

Tal subsunção encontra ainda guarida no princípio da especialidade, afastando-se a lei geral (estelionato, previsto no Código Penal) para aplicação de lei especial (Lei de Licitações), que melhor se conforma ao caso concreto.

Nesses termos, com lastro no art. 383 do CPP (emendatio libelli), altero a definição jurídica dos fatos contida na denúncia, para subsumir a conduta do acusado PAULO CELSO FONSECA MARINHO ao art. 90 da Lei n. 8.666/93, vigente à época dos fatos.

Necessário destacar, por fim, que o tipo penal previsto no artigo 90 da Lei n. 8.666/1993 atualmente corresponde à conduta prevista no artigo 337-F do Código Penal, por força das alterações introduzidas pela Lei n. 14.133/2021 (nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos).

Referida lei (Lei n. 14.133/21), que estabeleceu normas gerais de licitação e contratação revogou expressamente o art. 90 da Lei n. 8.666/93 (pena cominada de 02 a 04 anos de detenção), acrescentando ao Código Penal o art. 337-F, que tipifica a frustração do caráter competitivo da licitação e cuja pena é de reclusão de 04 a 08 anos. Tendo em vista que a nova lei é mais rigorosa, haja vista a previsão de sanção mais severa, não beneficiando o acusado, tratando-se, pois, de reformatio in pejus, vigora o princípio da irretroatividade da lei penal, aplicando-se, no caso, a lei vigente à época dos fatos.

3. DISPOSITIVO

Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido contido na denúncia para CONDENAR o acusado PAULO CELSO FONSECA MARINHO pela prática do crime previsto no art. 90 da Lei n. 8.666/93 (vigente à época dos fatos).

Passo à análise das circunstâncias judiciais (CP, art. 59).

Culpabilidade: normal à espécie delitiva. Antecedentes criminais: não possui registros. Conduta social: presumidamente boa. Personalidade: não existem nos autos elementos suficientes à aferição da personalidade do agente, razão pela qual deixo de valorá-la. Motivos: o normal da espécie delitiva, não autorizando majoração da pena. Circunstâncias: além daquelas circunstâncias elementares do tipo, não há outras que sugiram a majoração da pena. Consequências: não merecem maior reprimenda, pois não há notícia nos autos de que, a despeito do expediente fraudulento utilizado, tenham ocorrido desvios no desenvolvimento das ações do Programa de Incentivo à Produção e ao Consumo de Leite (Programa Leite é Vida); Comportamento da vítima: não aferível.

Tendo em vista as circunstâncias acima analisadas, fixo a PENA-BASE no mínimo legal, em 02 (dois) anos de detenção e multa no valor de R$ 34.000,00 (três e quatro mil reais), o equivalente a cerca de 2% do valor total do contrato firmado1, patamar que torno DEFINITIVA, diante da ausência de circunstâncias atenuantes ou agravantes, bem como causas de diminuição ou aumento de pena.

O regime inicial de cumprimento da pena pelo sentenciado será o aberto (art. 33, § 2º, “c”, do Código Penal).

Sendo uma medida socialmente recomendável, com esteio no art. 44, § 2º, segunda parte, do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade aplicada ao réu por duas penas restritivas de direitos, a saber:

a) prestação de serviços a comunidade, cabendo ao Juízo do local de residência do sentenciado indicar a entidade na qual ele prestará o serviço, na proporção de 1h (uma hora) de tarefa por dia de condenação (art. 46, § 3º, CP); e

b) prestação pecuniária, consistente no pagamento do valor de 02 (dois) salários mínimos a entidade pública ou privada (com destinação social), a ser definida pelo Juízo do local de residência do sentenciado, sendo facultado ao réu o seu parcelamento em até 10 (dez) vezes iguais.

Ressalte-se que a prestação pecuniária não exclui ou prejudica a pena de multa antes cominada.

Caso ocorra o descumprimento injustificado das penas restritivas de direitos, serão convertidas em privativa de liberdade.

Quanto à fixação de valor mínimo para a reparação dos danos causados pela infração penal (art. 387, IV, CPP – redação dada pela Lei nº 11.719/08), embora haja pedido expresso na denúncia, deixo de fixá-lo, pois, embora apontado pelo representante ministerial o valor de R$1.718.750,00 (um milhão, setecentos e dezoito mil, setecentos e cinquenta reais), nos autos somente consta cópia de documento autorizando o empenho em favor da empresa Laticínio Estrela no valor de R$ 786.000,00 (Id 643828511, pág. 168), não havendo nenhuma outra informação concreta sobre os valores efetivamente recebidos pela empresa pertencente ao réu, decorrentes do contrato objeto desta demanda, circunstância que não recomenda a fixação, nesta seara penal, de valores a título de reparação dos danos. Mais do que isso, conforme reconhecido na fundamentação supra, havendo a efetiva prestação do objeto do convênio pela empresa, a vantagem patrimonial recebida é devida, em decorrência da prestação do serviço.

Condeno o réu ao pagamento das custas judiciais (art. 6º, da Lei nº. 9.289/96).

Com o trânsito em julgado, lance-se o nome do sentenciado no rol dos culpados e façam-se as comunicações de praxe.

Cumpra-se o determinado em audiência realizada na data de 08/05/2018, quanto ao pagamento de honorários ao defensor nomeado para o ato, Felipe Thiago Serra Neto, OAB/MA n. 15.718 (Id 643828518, pág. 88/89).

Com o trânsito em julgado para o Ministério Público Federal, retornem os autos conclusos para análise de eventual prescrição, na modalidade retroativa.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

São Luís/MA, data registrada no sistema.

(assinado eletronicamente)

PEDRO ALVES DIMAS JÚNIOR

Juiz Federal Substituto da 2ª Vara

1 A pena de multa deve ser aplicada de acordo com os parâmetros estabelecidos no artigo 99, caput, e § 1º, da Lei de licitações (vigente è época dos fatos), ou seja, não pode ser inferior a 2% nem superior a 5% do valor do contrato licitado ou celebrado.

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